Tudo começa com a difícil missão de explicar o desejo de escrever. Escrever é concretizar o dito desejo, mas não necessariamente, torná-lo real na medida em que se prolifera. O desafio então é ser fiel ao desejo pelo instante em que ele é criado. Assim consta a sensação, isto é, o produto do desejo num instante.
Parece louco relacionar tantos conceitos num só parágrafo: escrever, instante, sensação. Mas não existe, no entanto, outra performance adequada. A idéia aqui é negar o sentido da ordenação das palavras, justamente por admitir que elas são capazes de se autossustentar, não pelos sintagmas, mas sim pela sensação que proporcionam ao [momento] desejo.
Desconsideremos a ordem. Duas coisas, no entanto, permanecem inalteradas quanto ao seu sentido: momento e desejo. Para que ambos possam fazer parte do mesmo mundo, é preciso considerar aquilo que de especial faz com que o desejo seja, efetivamente, um desejo, e o momento seja, de fato, momento. Entende-se como sensação.
A problemática, então, é conceituar ou quem sabe, apenas nomear coisas tão abstratas, não só pelo fato de não serem concretas, mas abstratas por estarem fora de um entendimento comum. O que é a sensação para mim? Se escrevê-la pode ser que tu, leitor, não a compreendas.
O que é a sensação para você? Pode ser que nem mesmo tu a compreendas, caso a escreva e, momentos depois, a leia. A sensação, neste caso, não é verdadeira. A sensação torna-se uma versão contada do desejo sentido.
Por isso é tão importante negar a ordem com que a sensação [desejo] é descrita. Na verdade, ela é o que menos importa. Mas ainda sim, surge no homem (generalizado) a necessidade de pontuar essa coisa que nos impulsiona a escrever o que sentimos pelo desejo de expressar o momento.
Não nego que já o tinha pensado antes. Ou pelo menos pensei que tivesse pensado. O fato é que não fui genial o suficiente para chamá-lo Haicai. Não me atrevi a explicar o momento. Cai na mesmice de representar o momento póstumo. Já não era ele. Era uma versão.
Com isso, ao aceitar o Haicai e admitir a minha total incapacidade (comum) de não prescrevê-lo, admito que minha afirmação alcançará o nível de artigo acadêmico assim que for descoberta uma forma de provar o que escrevo pelo que sinto. Enquanto isso não flui, continuo apenas a me apropriar da idéia do Haicai. Mas acrescento: o Haicai é a tentativa de não contarmos a versão do desejo. É a tentativa de materializar o desejo em si.
“O Haicai é DESEJO, na medida que circula, isto é, momento.”